Ensinamentos de leste com Petrov (Parte II)

Terça, 01 Maio 2012


Que diferenças culturais… que diferença de mentalidades…

Depois de no primeiro artigo de opinião me ter debruçado sobre alguns aspetos históricos que modelaram a cultura soviética e que, consequentemente, influenciaram (e ainda influenciam) o método de treino do leste europeu, nomeadamente com a procura da perfeição técnica, nesta segunda parte vou apresentar algumas diferenças entre o que Vitaly Petrov “ensinou” e o que é feito no nosso país.

Especialização precoce, roubos, etc. – Serguey Bubka, nascido e criado num quartel militar, teve uma infância repleta de actividades físicas e desportivas. Experimentou vários desportos colectivos (o futebol e hóquei no gelo eram os seus favoritos) e era um “ás” na ginástica, chegando mesmo a ser selecionado para um grupo de treino especializado… Mas aos 10 anos, o destino alterou-se (ou se calhar esse era mesmo o destino, se é que existe destino) quando um amigo de Bubka o convidou para experimentar salto com vara. Bubka aceitou e foi então que Vitaly Petrov o conheceu. Como o treino dos jovens deve ser bastante completo (e porque o de salto com vara também o deve ser), Petrov colocou Bubka a fazer um pouco de tudo, privilegiando (para além do salto com vara) o salto em altura e o salto em comprimento uma vez que considera que a chamada para o salto com vara está “no meio” do salto em altura e do salto em comprimento.

Não é que Bubka começou a ter resultados invulgares no salto em comprimento para a sua idade? Só para se ter uma ideia, aos 13 anos aproximou-se dos 6.50 metros… Com estes resultados fantásticos, o que é que Petrov fez? Protegeu Bubka, não o deixou mais fazer provas de salto em comprimento porque já estavam a tentar “roubar” Bubka de Petrov e a querer desviá-lo do objectivo principal que era tornar-se um grande saltador com vara.

Era legítimo do ponto de vista de Petrov, ele não queria perder o seu “diamante”, um talento nunca antes visto! Mas atenção, Bubka só deixou de competir em provas de salto em comprimento, não deixou de saltar em comprimento. Fazia-o era apenas em treino, assim como fazia salto em altura, barreiras, ginástica… Tudo isso, com doses certas, é fundamental para um saltador com vara, independentemente da sua idade.

Muitos provavelmente viram Bubka a entrar apenas em provas de salto com vara e a pensar “Está tramado! A especialização precoce… Não vai dar nada em senior”. Na verdade, ninguém pensou isso porque com aquela idade, Bubka era um desconhecido para os portugueses… E somos nós que estamos acostumados a pensar assim!

Daí perguntar, será que entrar numa única disciplina desde os escalões jovens significa especialização precoce? Será que um atleta tem de participar em várias disciplinas “oficialmente” para mostrar que está a ter um treino completo? Isso do show-off é muito nosso… Gostamos de exibir o que não somos mas que gostaríamos de ser, ostentar o que não temos mas gostaríamos de ter, etc.. E a pura e dura verdade é que muitos jovens atletas participam em provas que nunca têm contacto nos treinos. Vão fazer salto em comprimento, lançamento do dardo, peso, etc. em provas sem antes terem treinado para as mesmas. Será que isso é que é o aceitável? Será que esses é que não estão a ter uma especialização precoce? Será que isso não é tapar os olhos? Então quando chegam os regionais, já que os atletas podem fazer três provas, é vê-los meter o atleta X nestas provas, o Y naquelas, o Z nas outras, o W nas restantes só para fazerem mais pontos.

Realmente é irónico… Uma coisa é certa, o treinador é que sabe o que está a fazer com os seus atletas. Aquele que é acusado de estar a especializar precocemente o seu atleta pode ser aquele que está a fazer o trabalho correcto e a usar as outras disciplinas em treino, para melhorar na disciplina em que querem apostar. E se isso assim é, que se lixe o que os outros pensam.

Olhando para a carreira perfeita de Bubka, só posso estar satisfeito com a protecção que Petrov fez naquela altura. Bubka não podia ter sido um campeão maior do que foi enquanto saltador com vara!

Em Portugal, no salto com vara, antes do grande Edi Maia, podia ter havido um grande campeão (e atualmente podia dar luta ao Edi). Foi um atleta que, desde iniciado, começou a bater todos os recordes jovens de salto com vara até que um dia, fez uma marca jeitosa no comprimento e meteu na cabeça que podia ser o futuro Mário Aníbal… Passou então a dedicar-se ao Decatlo e de títulos nacionais seniores, só obteve um: no salto com vara, pois claro. Pouco tempo depois deixou o atletismo e foi pena o salto com vara português ter perdido aquele atleta para as provas combinadas. É pena que não exista outra vida para saber o “se tivesse ficado dedicado apenas ao salto com vara?”… Estou a cair na velha história do “se” quando o “se” não existe. Peço desculpa...

Ensinamentos de leste com Petrov (Parte I)

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