Os erros sucessivos de Daegu

Segunda, 05 Setembro 2011
O Mundial de Ar Livre de 2011 terminou, com a Jamaica a ajudar no brilho do evento, que teve demasiados problemas para quem designa esta a segunda maior competição desportiva do planeta, a seguir aos Jogos Olímpicos. Para quem já teve a oportunidade de sentir o Mundial de duas formas, como espetador no sofá e como espetador no estádio, com toda a certeza olhou para esta edição com alguma desconfiança no que toca à boa divulgação da modalidade. A desclassificação de Bolt até poderia ser um incentivo para dar um bom air-play ao evento, mas é difícil mostrar aos outros que a regra é correcta, enquanto decorre um Mundial com alguns erros que parecem de amador...

Comecemos pelo que correu bem e de facto o que correu bem também foi inovador, mas também algo muito pouco divulgado, não ajudando à mudança da imagem sobre este Mundial. Sem dúvida que o controlo de doping a todos os atletas, sem excepção, foi uma vitória para a modalidade, que mais uma vez é pioneira nesta luta, mas temo que o número de dopados comece a ser criado em breve, uns por desconhecimento desta luta, outros por distracção, outros por acharem que ainda assim conseguem escapar. Apesar de tudo foi mais sensata a opção de alguns atletas abdicarem a presença no Mundial à última da hora, alegando “lesões”, maus momentos de forma ou outras desculpas para não terem à chegada de Daegu três tubinhos para recolha de amostras. A outra novidade, é a introdução de ecrãs televisivos junto dos juízes de pista, uma medida proposta por Jorge Salcedo (o tal que também ajudou a implementar a regra da falsa partida zero), o que terá permitido um ajuizamento mais justo e muitas vezes viam-se atletas a espreitar para o ecrã do juíz, só para ver se o movimento foi bom, ou para verificar o porquê do nulo. Batalha ganha internamente, mas uma batalha que não foi divulgada como um dos avanços do atletismo face a outras modalidades, nomeadamente o Futebol que anda há anos para introduzir este tipo de medidas..

Já quanto ao que correu mal, por onde começar?! Comecemos pela parte técnica do evento, desde já percebendo alguns dos problemas, já que também o Atleta-Digital sabe o que é ser parceiro técnico de um grande evento, depois da experiência na Taça da Europa de Marcha. A incompreensão é mais sobre o facto de coisas que maioritariamente correram bem noutras edições terem agora corrido mal. Na internet em alguns momentos os Live Results simplesmente não existiram ou tiveram um desfasamento temporal alargado (o contrário da palavra Live) e chegaram a existir classificações incompletas ou inexistentes por largas horas, como por exemplo os resultados da Taça do Mundo da Maratona feminina...Para ajudar à festa no único dia em que houve um recorde do Mundo, no último, o site da IAAF esteve em baixo e com utilização muito limitada o que, no meu caso me levou a um site externo para poder consultar os resultados.

Em termos organizativos não haverá demasiado a dizer, a não ser o nefasto vento contra na recta da meta, onde as provas de velocidade e barreiras tiveram dificuldade de vingar, não só por causa do vento, mas também...Da mesma forma é pouco entendível como num dia de finais importantes se colocam provas para deficientes (com direito a medalha, hino e tudo!) mesmo no meio do programa de provas...Será que Nelson Évora pode ir aos campeonatos destinados a deficientes? Concordo com a introdução de provas de exibição, mas nunca num momento crucial do evento e muito menos com direito a honras de campeão do mundo...Também o público coreano não preencheu as bancadas da forma que se poderia esperar, pelo que não se percebe como alguma vez foram anunciados tantos bilhetes vendidos..

Agora o maior dos erros, que entre acusações tanto podem ser apontados à IAAF, como a produção local da transmissão, ou a ambos : a transmissão televisiva. Quem teve a infelicidade de ver o evento pela televisão viu uma realização extremamente insensata, dando destaque a coisas sem destaque e tirando destaque a vários dos campeões do Mundo que não tiveram quase audiência possível...A maior parte dos concursos foram integralmente gravados e passados a posteriori, no intervalo dos eventos de pista, mesmo que fossem batidos recordes de campeonato, como aconteceu no lançamento do dardo feminino. A utilização das imagens em super-slow-motion revelou-se maioritariamente inútil, sobre movimentos faciais e não sobre movimentos da especialidade. Os separadores entre provas tinham demasiados segundos para quem tinha demasiadas coisas para mostrar e as repetições eram demais para o tipo de transmissão que estava a ser feito. Até os grafismos tiveram problemas, na mistura com a imagem, o que até parecia uma realização de uma televisão amadora, em certos momentos...

Como em Portugal não há o hábito de ter a televisão a acompanhar o seu directo com os jornalistas que tem no terreno, um hábito que infelizmente poucos países têm, limita-se que exista um comentador a fazer os comentários a partir de Portugal, com o seu trabalho a ser baseado em informações provenientes da internet em vez das informações visuais da produção difundida para todo o Mundo através dos vários broadcast. Culpa da IAAF ou não, a verdade é que a prioridade aos eventos de pista não deve ser imperativa ao ponto de esquecer concursos fantásticos e de tirar toda a dignidade a campeões do Mundo tão campeões como todos os outros...E o desporto vive das reacções, dos festejos, das respostas desportivas, dos desaires e uma transmissão de um Mundial não pode nunca depender dos dias em que participa Usain Bolt, que chegou a ter demasiado tempo de antena em detrimento de um grande salto ou de um grande lançamento. E depois é claro, continuaremos a ser modalidade que as pessoas não gostam “porque é só correr e correr é chato”, quando o atletismo tem mais do que isso para oferecer, mas não mostra nos principais momentos com a mesma dignidade. Aqui é a promoção da modalidade que fica em risco, porque não basta a IAAF estar sentada na cadeira e aplaudir porque tem 202 países em participação e teve uma difusão de sinal superior a Berlim...Este modelo de transmissão já existe há demasiados anos e os coreanos conseguiram levá-lo ao extremo da idiotice, para total desmérito de quem viu e poderia ter actuado a tempo para impedir uma transmissão de fraquíssimo nível. Das duas uma, ou se muda ainda mais o modelo competitivo, ou se muda a estratégia televisiva, porque não se pode alegar que a regra da falsa partida é também para ir de encontro aos interesses da televisão e depois transmitir provas de corridas até à exaustão e perderem-se os melhores momentos dos concursos...

A imagem que se fica destes Mundiais é que ficaram muito longe da dignidade da modalidade, não chegando nem aos calcanhares das edições mais recentes de Osaka (2007) ou Berlim (2009). A próxima edição, em 2013, será na Rússia e será que se vai continuar com a mesma estratégia?!

Por : Edgar Barreira

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