Iniciamos hoje uma das cinco histórias do frio, histórias para se lerem à lareira enquanto se espera um familiar, histórias para se lerem de manhã ainda no quentinho da cama, histórias que gostaríamos que fossem de facto lidas seja lá qual for o propósito e a vontade.
Começo a minha história a partir da cidade da Guarda, a cidade mais fria do país, num período de baixas temperaturas em Portugal, mas de muito mais frio na restante Europa. Se o que caiu em cima de mim numa das noites que aqui passei foi neve, então o que será de facto neve?! Reconheço que correr lá fora com esta temperatura que se faz sentir pode não ser agradável mas, nada que uma roupa mais adequada não resolva, porque afinal estando o corpo quente, todos os passos de corrida acontecem naturalmente.
Recentemente, durante a apresentação da Maratona de Lisboa, mais uma vez se falou da vantagem que é realizar-se uma Maratona em Portugal no mês de dezembro. A Europa mais gelada terá dado a devida resposta, com metade dos participantes previstos a virem de fora. A verdade é que quando Portugal tentou Maratonas no mês de abril, elas acabaram fracassadas ou excomungadas. Um dia antes desta Maratona, decorrerá na cidade de Budapeste mais um Europeu de corta-mato, prova sempre gelada, com frio, neve e chuva, onde ao longo da história, se exceções houveram, essas exceções ocorreram quando a prova se organizou por terras luso-espanholas. Para já a previsão é de neve para a cidade de Budapeste, no próximo fim-de-semana.
Escrever as histórias do frio sem a real perceção do que é o frio, pode ser, talvez, um desafio maior, mas descanse a audiência, vamos falar mais do que de frio. Os costumes natalícios, as histórias proféticas dos Maias, a componente solidária e a chegada ao ano de 2013 são outras componentes que merecerão o devido destaque durante este mês de dezembro.
Enquanto a neve da Serra da Estrela vai derretendo com o decorrer do dia, vamos “transportar-nos” para o Pólo Norte, onde todos os anos se realizam provas de longa distância, sobre o gelo (Maratona e 100 quilómetros). Os cerca de trinta graus negativos que se fazem sentir acabam por estar muito acima dos padrões que a maioria de nós conhecerá. Os participantes são levados para o local de helicóptero ou avião, em pistas de gelo improvisadas. A adaptação ao clima é feita através de acampamentos-base e os equipamentos deixam de ser o calção e a t-shirt técnica, para passar a ser um equipamento mais pesado, mas que cubra a quase totalidade do corpo. O gelo que se acumula no equipamento não é aqui mais que um testemunho da dureza da prova, não é uma realidade que aconteça noutros lados, não é uma realidade ao alcance de todos. E se há a superação que muitos sentem ao completar a prova de Maratona, aqui é completá-la com a neve por cima dos tornozelos. E como se tal não bastasse, há quem aposte na prova dos 100 quilómetros. Não saberei comparar esta superação com outros tipos de superação, mas qualquer um de nós saberá compreender que se não temos objectivo de obter esta superação, então teremos de dar graças ao espaço onde vivemos e às temperaturas que nos acolhem de forma extremamente favorável…
O outro apelo à corrida vem de uma das minhas primeiras viagens, quando ainda jovem visitei a cidade de Londres. Julgo que estávamos em fevereiro e tenho a certeza que havia frio. Estava na cidade de Brighton, a sul de Londres, o Algarve dos britânicos. A praia de seixos redondos era fria, a água era insuportável, ainda que o famoso pontão de Brighton fosse bem aquecido (como a maioria das casas). Estava a passear na rua, por volta das 10 horas da noite e na marginal vários atletas corriam, no seu treino do dia, após as vidas profissionais que cada vez mais afetam as vidas familiares e pessoais. Ainda que em tendência progressiva, estamos longe de ter uma realidade destas e, ironicamente, temos um clima muito mais agradável para isso. Na mesma cidade, mas na pista de tartan, crianças e adultos treinavam para as provas de pista do Verão, sem que um “skipping” fosse atrapalhado pelo frio, ou mesmo que o peso caísse na relva e ficasse metade dentro e outra metade fora. Não estou a tentar apelar que a chuva e o frio a baterem no pêlo são totalmente saudáveis, embora os malefícios possam ser minimizados com uma adequada protecção ao frio. O apelo vai para que o clima português seja um motivador de massas, um aglutinador de sensações boas que, em comparação com a nossa velha Europa, estão muito longe de serem uma limitação.
Termino a primeira história, mas na próxima segunda-feira uma nova história irá aguardar a sua leitura, desta vez a pensar na corrida às comprinhas...