Corrida de Sesimbra 2009

Domingo, 11 Outubro 2009
“ Parecerá a muitos que este meu diário, feito para mim, é artificial demais. Mas é de meu natural ser artificial. Com que hei-de eu entreter-me, depois, senão com escrever cuidadosamente estes apontamentos espirituais! De resto, não cuidadosamente os escrevo. É, mesmo, sem cuidado limitador que os agrupo. Penso naturalmente nesta minha linguagem requintada.”

Fernando Pessoa

Não me apetece especialmente falar da boa organização em geral, a cargo da Câmara Municipal de Sesimbra com o apoio técnico da Xistarca, do valor acessível das inscrições e da facilidade destas, da suficiente informação disponibilizada antes e depois da prova, nomeadamente no que às classificações diz respeito que foram muito rapidamente divulgadas na internet, no levantamento dos dorsais sem qualquer dificuldade no dia da prova, da boa segurança e sinalização do percurso apesar de alguma atribulação em certas zonas estreitas onde os atletas se cruzavam, nomeadamente no porto de pesca, nem da animação geral, quer do público quer da organização. Nem sequer me apetece falar das medalhas de presença e das bonitas t-shirts que a todos foram oferecidas, nem dos suficientes abastecimentos ou da pontualidade que existiu, ou da falta de exactidão da distância anunciada, ou ainda da meta organizada ou do controlo por chip. Muito menos me apetece falar das 61 mulheres e dos 584 homens chegados à meta este ano, contra as 58 e os 574 do ano passado, nem dos vencedores nem dos prémios monetários por classificação. Nem dos tempos ou de outros números, nem de muitos outros dados e factos que confirmariam que esta edição foi mais uma edição de sucesso, merecendo a preferência dos atletas, e os meus sinceros parabéns à entidade organizadora e todos os seus apoiantes.

Apetece-me sim falar da corrida. Da minha corrida. Do mar e de mim e do amor. Daquele que me faltou, do que me acompanhou e do que fui encontrando pelo caminho, em variadas formas. Tão variadas quanto as formas de vida. É isto a vida, é isto a corrida. É partir com esperança, e esta se perder e se encontrar vezes sem conta. Sem nunca nos darmos por vencidos. É sorrir e chorar e sentir o sal do mar nas nossas lágrimas caladas que já não têm razão de ser, mas que ainda assim espreitam, sobem num laço apertado até à garganta e se querem fazer soltar, dizendo agora que são de alegria. É encontrar a doçura da vida nos olhos da minha filha e do meu pai, e deixar-me abraçar por eles enquanto corro mesmo já em sofrimento.

Quero falar do bem que ela me faz. Do abraço que me dá em cada passo que dou. Em cada meta que alcanço, em cada olhar, em cada pulsar de sangue sob o efeito dela. Quero falar dela. Do amor por ela. Quero falar dela e dizer tudo o que ela me dá e me faz ser e sentir, mas por mais palavras que debite… nitidamente …não consigo…

Por: Ana Pereira

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